sábado, 26 de setembro de 2009

Discurso de Alexandre Alves Costa no Comício de dia 21 no Teatro Gil Vicente


Companheiras e companheiros


As minhas palavras constituem uma explicação simples sobre a minha aceitação em ser mandatário da lista do Bloco de Esquerda, por Coimbra, para as próximas eleições legislativas. Não farei nenhum discurso de propaganda eleitoral, nem penso mandar, nem controlar as acções dos meus companheiros. Nem eles deixariam seguramente!
Representá-los-ei, com muita honra, em quaisquer circunstâncias. Agradeço muito a confiança que em mim depositaram.

São três as palavras-chave que dão as minhas entradas hoje aqui e espero que continuem presentes na minha vida toda: amizade, fidelidade e esperança.

A amizade que me liga aos companheiros do Bloco de Esquerda de Coimbra, particularmente, desculpem-me os outros, ao José Manuel Pureza, cabeça de lista. Participei com eles na construção de um projecto para Coimbra, numa aventura autárquica, aliás de resultado ruinoso, por minha exclusiva responsabilidade.
Esse projecto colectivo iluminou muito do que ainda penso sobre Coimbra e sobre as cidades médias portuguesas, mas foram os laços de amizade e solidariedade que então cimentamos que me prendem a todos irreversivelmente.
Tentamos aqui afastar-nos da reconstituição que se fecha sobre si mesma, representando bem o dominante da nossa cultura, inventora de concórdias e verdades médias.
Apeteceu-nos na altura, e ainda nos apetece, construir, em simultâneo, a vertente que garanta uma relação estável e serena com o mundo a quem forneceríamos o esperado, na continuidade da repetição das formas e dos temas e, ao mesmo tempo, a vertente que indaga de forma mais profunda o real, inventando o que não existe ainda e jamais virá à existência, senão através da imaginação.
Coimbra é um dos nossos lugares, com todos os passados que nos constituem e com um projecto de futuro em que podemos colaborar: transformá-la, justificadamente pela sua imensa riqueza humana e cultural, num lugar central e encontrar nela pretexto para intervir, descomplexadamente, no debate pós-moderno da cidade contemporânea.

Mas é também e sempre, a fidelidade a esta cidade que cruzo, desde a primeira adolescência, em tempos diferentes, marcantes na minha conformação pessoal.
Primeiro a casa do João Cochofel, a caminho das férias no Senhor da Serra. A gente da Revista Vértice, os neo-realistas que me revelaram um Portugal diferente e me ensinaram a nadar, a jogar pingue-pongue e a gostar de música: recordo o João Cochofel, o Lopes Graça, o Gomes Ferreira, o Carlos Oliveira, o Namorado, o Mário Braga e, depois, Coimbra que, mais do que da Rainha Santa ou da Inês de Castro, foi, na boca deles, a Coimbra de Antero de Quental.
Num segundo tempo a tomada da Bastilha de 1961. Lembro a nossa entrada triunfal na cidade, vindos do Porto, cantando a Marselhesa durante os quilómetros que calcorreamos a pé, depois do nosso autocarro ter sido confiscada pela PIDE. Logo a seguir 1962/69, as lutas estudantis que abalaram o regime, a minha entrada e saída do Partido Comunista nas barricadas de Maio de 68 e com os tanques soviéticos em Praga.
E, finalmente, a Universidade de Coimbra, onde trabalho há mais de vinte anos, que me recebeu como membro de direito e onde encontrei outras plataformas de debate e aprendizagem.
E, a propósito desta minha fidelidade à cidade e à universidade, aproveito para vos contar que, um dia, encontrei o Antero nas Escadas de Minerva que me perguntou:

Então tu agora já não achas que é preciso caminhar sobre as ruínas da Universidade como quem caminha num campo de flores?

São outros tempos, disse-lhe, aproveitando a deixa para lhe anunciar, a medo, que tinha aceitado ser mandatário desta lista.

Então tu agora, Alexandre Alves Costa, acreditas que o voto é a arma do povo? Perguntou com severidade.

Tentei explicar-lhe: é que temos o Bloco de Esquerda que é uma nova esperança. E eu já estava farto, porque o que me cansa não é caminhar, é não acreditar.
Além disso, está lá toda a malta, como se dizia no MUD Juvenil.
E eu, que, como sabes, apoiei, em diversas circunstâncias, o Otelo, o PSR, a UDP, a Política XXI, a Maria de Lourdes Pintassilgo, agora estou no Bloco porque, não quero viver num país que desperdiça os seus recursos humanos através da desigualdade, da precariedade, do desemprego e da falta de acesso ao conhecimento.
O Bloco, e eu com ele, acreditamos que é possível utilizar o combate à crise na luta contra o nosso atraso estrutural.

E tens esperança? Perguntou com um sorriso irónico.

Sim, Antero, tenho e digo-te mais: com a Catarina na Câmara, o Zé Manel no Parlamento e a Marisa na Europa, participaremos no desenho de um novo mapa, para a cidade, para o país e para a Europa.
Eu quero estar com eles e, por isso aqui estou… com esperança!

Mas isto que vos disse, queridos companheiros, não significa que deseje que, algum dia, me abandonem aquela severidade crítica e aquele sorriso irónico, porque, acima de tudo, quero continuar a ser perturbado, sinal que estou vivo.
Também, porque sei que não é tanto a verdade que nos fascina, mas o processo em que consiste a sua busca, com a visão nela do que falta e não do que aparenta.

Muito obrigado
Alexandre Alves Costa

Alexandre Alves Costa, Arquitecto é mandatário da lista do BE às legislativas por Coimbra e candidato na lista do BE às eleições autárquicas por Coimbra.

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